7 de abr. de 2011

Por Dentro

você não pode ver, mas debaixo desta casca, meu miolo escurece. não pode ver, mas, por trás deste verde, firme, brilhante, as coisas são de outra cor. estão em outro estado. eu apodreço. é o negro, ainda pequeno, crescendo próximo ao caroço, que explica o forçar do riso, quando não vejo graça. o beijo, quando prefiro o cuspe. a vontade de estar do outro lado da rua, na calçada oposta e de cabeça baixa, quando me surpreendo com o encontro. é a mancha escura, crescendo a cada dia, perto das sementes, contaminando a polpa branca e suculenta, que explica as juras de pra sempre, quando sei que o prazo está vencido. que as coisas terminaram. são os pequenos bichos, ainda microscópicos, se multiplicando famintos e silenciosos, que explicam o concordar, quando gostaria de quebrar a sala, derrubar os quadros, os potes, os vasos. que explicam o silêncio, quando gostaria de mostrar a língua, o dedo, gritar. é essa mancha escura, minúscula, escondida no meu miolo, que, só por ser pequena, ainda me faz suportar esse ambiente. a repetição do trabalho. a burrice. a lerdeza. seu lado medíocre sobrepondo o restante. enquanto tudo ainda é pequeno, consigo manter esta casca verde, firme, brilhante. enquanto a mancha não se espalha por completo, câncer pela polpa virgem, ainda consigo o sorriso no lugar do palavrão. o silêncio no lugar do grito. o beijo no lugar do cuspe. o sim no lugar do não. por baixo desta casca, apodreço a cada minuto. aos poucos. você pode não ver, mas eu aviso: estou mudando a cada dia. por dentro, sou outro.

                                                                             


                                                                                Eduardo Baszczyn 

12 comentários:

  1. Sabe.... Aqui o meu sorriso não sobreviveu, sobraram-me os palavrões.

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  2. Linda essa foto, é vc mesma?
    Obrigada por passar no meu blog.
    Gostei desse post. Fala de como o Ego é cobre nosso interno, bjs CY.

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  3. Me surpreendi com a intensidade imensurável das palavras...Lindo texto!

    Bjo e ótima quinta!


    wwwsinparangon.blogspot.com

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  4. Tambem amei teu blog e voltarei mais vezes!

    :)

    Milhoes de beijos

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  5. "você pode não ver, mas eu aviso: estou mudando a cada dia. por dentro, sou outro."

    isso é a nossa graça...a de que não estamos nunca inteiros...vivemos numa eterna "em construção"

    Um beijo, Lilian!!

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  6. E essa fase de ocultar o verdadeiro ''eu'' que é interessante. Eu acredito piamente que algumas pessoas não são o que dizem e isso está estampado na cara, mas por dentro ninguém poderá saber, nem o que sentimos, nem o que pensamos. Belo texto.

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  7. Literatura da melhor qualidade, texto que a gente guarda e relê.

    Um beijo.

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  8. Renata disse:
    Eu estou tão diferente...mas involuntariamente não deixo transparecer isso.Escrever compensa muitas coisas,inclusive sacia o desejo de vingança e verdade.

    *Incrível post!
    Bjss Lilian!!

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  9. Ainda bem que tenho uma máscara. Não fosse assim, você não sobreviveria.

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  10. Tem um conto no meu blog que chama "A menina do armário" e eu falo justamente sobre isso.
    A gente tem mania de se esconder em fortalezas para não mostrar que no fundo, nós também sofremos.
    Ótimo texto.

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  11. "Você pode não ver, mas estou mudando a cada dia. Por dentro sou outro."

    Pô, amei isso.É bem isso mesmo.

    Beijo!

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  12. A mudança é a consequência do aprendizado. Você não precisa provar nada a seu respeito, as pessoas que devem notar isso em você.
    e o que nos permite : sensibilidade.

    me sinto bem aqui, beijos...

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