5 de set. de 2012

O último


O podre se apega a nós, nos persegue, nos tira a razão e a infinita corrida em direção à luz nos faz perceber em profundidade que estamos TODOS – sem exceção – perdidos como náufragos ao mar. E a luz, sempre à frente, inalcançável, guiando-nos pelo seu trajeto torto e cheio de armadilhas.
Felizes os ingênuos, os burros, e os filhos-da-puta.
Percebo o peso da idade quando sinto em minha mente a presença de cada vez mais pensamentos aos quais eu não posso – ou não consigo – dar vazão. Sempre tive facilidade na hora de traduzí-los em parágrafos, mas esse artesanato leva tempo, é cansativo e, certas vezes, quando finalmente deglutimos um assunto, já somos atropelados pela urgência de uma vida que somos obrigados a viver, do abrir ao pregar dos olhos. A vida passa fulminante enquanto escrevemos sentindo e avaliando o peso de cada palavra. Incapazes de expressar mazelas e exorcizar demônios criados por nós mesmos, adoecemos em lenta morte, infeccionados pelos nossos próprios defeitos.
(...)
Digo isso porque, afinal, lá no fundo, a gente sempre sabe quando tá fazendo merda. E é nesse ponto que eu discordo de quem diz que somos, essencialmente, bons e puros de espírito. Na verdade, compactuo com a hipótese de que, se não exercermos controle firme sobre nossos pensamentos e atitudes, transformamo-nos em nada mais do que o lodo do lodo. O erro está na nossa alma, e cada descuido é um curativo para as mais-de-mil chagas que se espalham por sua superfície.
Descobrir-se imperfeito, defeituoso e incapaz (e escrever sobre isso) é o que me impede de desmoronar. Essa obra inacabada que todos somos precisa de andaimes, estacas e apoios para se manter de pé. Família, amigos, músicas, drogas… usamos o que temos ao nosso alcance, embora saibamos que jamais estaremos prontos. Jamais.
Viver é perigoso. O mundo é veloz, cruel, e cheio de arestas. Só está a salvo quem está morto.

Lucas Silveira


5 comentários:

  1. Muito foda!!! O que mais dizer de um texto massa desses? esta vida é mesmo uma droga e nós não somo nada de essencialmente bons, cabe vigiar, cabe tentar aperfeiçoar, só assim pra que essa contrução crie forma e jeito.

    Milhões de beijos

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  2. Isso prova que a vida é uma incessante escola. A reforma íntima é incessante.
    A salvos... "Talvez, depois de mortos".

    bjo Lilian

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  3. Palavras fortes. Diria até um pouco pessimista. Mas a vida consome mesmo e muitas vezes tira de mim a vontade de escrever, de me expressar e até de sonhar.

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  4. De tamanha profundidade, que ao iniciar me deleitei neste texto.

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  5. Onde ele continua a escrever? Poderia me passar o link?

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